O QUE A BÍBLIA RELATA SOBRE DIVÓRCIO E NOVO CASAMENTO ?
O QUE A BÍBLIA RELATA SOBRE DIVÓRCIO E NOVO CASAMENTO ?
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Sumário
Introdução.
1. O registro do divórcio no Antigo Testamento.
2. O registro do divórcio no Novo Testamento.
3. Divórcio e Novo casamento.
4. Argumentos teológicos a favor do divórcio.
5. Argumentos teológicos contra o divórcio.
6. Posição oficial sobre o divórcio nas principais denominações cristãs.
Bibliografia
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INTRODUÇÃO.
Quando estudamos questões relacionados a união de um casal baseado em um estudo teológico, estamos nos referindo ao casamento propriamente dito.
A formação do homem registrado em Gênesis 2.7 e da mulher em Genesis 2.22 mostra que a intenção de Deus era a formação de um casal para viverem juntos tal como citado em Gênesis 2.24 atraves da expressão "tornando-se os dois uma só carne".
O casamento através da união do homem como marido e da mulher como esposa está sujeito a separação, que denominamos como divórcio.
Esse artigo irá estudar o tema "divórcio" e todas as possibilidades existentes dentro do contexto relatado nas Escrituras Sagradas.
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1. O REGISTRO DO DIVÓRCIO NO ANTIGO TESTAMENTO.
A questão do divórcio no Israel antigo passou por mudanças significativas entre o período pré-exílico, isto é, antes do exílio babilônico ocorrido em 586 a.C e o período pós-exílico que vem a ser o período do retorno do cativeiro, a partir de 538 a.C.
1) Período Pré-Exílico
Em Deuteronômio 24.1-4, o divórcio era exclusivamente da parte do homem que podia despedir a esposa com base em algo "indecente" ou "vergonhoso", e nesse caso era necessário dar à mulher uma carta de divórcio por meio de um ato jurídico que promovia o rompimento e permitia que a mulher se casasse novamente.
Esse procedimento era mais doméstico com pouca intervenção religiosa ou judicial formal.
Na maioria das vezes, a mulher divorciada durante o Israel antigo podia se tornar socialmente marginalizada e vulnerável, especialmente se não houvesse família que a acolhesse.
2) Período Pós-Exílico
Em Esdras capítulos 9 e 10 e Neemias capítulo 13 é relatado que após o exílio, houve um esforço de purificação religiosa e os casamentos com mulheres estrangeiras foram denunciados como pecado contra Deus.
Líderes como Esdras e Neemias exigiram que judeus se divorciassem das esposas estrangeiras, não por adultério ou indecência, mas por questões de pureza religiosa e identidade nacional.
Nesse período da história do povo Judeu a autoridade religiosa teve papel decisivo no divórcio que era era tratado como uma questão de aliança com Deus.
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2. O REGISTRO DO DIVÓRCIO NO NOVO TESTAMENTO.
No período do Novo Testamento, o divórcio entre os judeus era organizado pela tradição rabínica e fortemente influenciado pela Lei de Moisés, e o divórcio era legalmente permitido, porém Jesus e outros líderes discutiram seus limites.
1) Base Legal e Prática Judaica
A ordenança do Divórcio se baseava em Deuteronômio 24.1-4, mas agora era interpretada pelas escolas rabínicas que obrigava um certificado de divórcio por escrito ao qual deveria ser entregue pelo marido à esposa, com testemunhas.
Havia tribunais locais que supervisionava o desenvolvimento do processo e validavam o divórcio.
2) As Escolas Rabínicas
No tempo de Jesus, duas escolas dominavam o debate, a escola de Shammai que aceitava o divórcio apenas em caso de adultério ou imoralidade sexual grave e a escola de Hillel que permitia o divórcio por "qualquer motivo" que tivesse controvérsia entre os cônjuges
Essa divergência entre a escola Shammai e a Hillel aparece claramente no contexto de Mateus 19.3-9, quando os fariseus perguntam a Jesus:
"É lícito ao homem repudiar sua mulher por qualquer motivo?"
Isso reflete exatamente o debate entre a escola Shammai e a escola Hillel.
3) A Posição de Jesus
Nos evangelhos é relatado que Jesus restringe severamente o divórcio, pois em Mateus 19.9, Ele afirma que o divórcio só é permitido em caso de imoralidade sexual, e em Marcos 10.11-12, proíbe-o totalmente.
O contexto de Mateus 19.3-9 dá a entender que Jesus rejeitou o abuso da permissão mosaica, explicando que foi dada "por causa da dureza de coração"(Mt19.8), mas que no princípio o plano de Deus era a união indissolúvel (Gn 2.24).
4) No Mundo Greco-Romano.
Entre os gentios, tanto homens quanto mulheres podiam iniciar o divórcio, e o mesmo
era comum entre os romanos e gregos.
Um simples documento por parte do homem ou dá mulher era suficiente para apresentar o divórcio.
5) A Posição de Paulo
Em 1Coríntios 7, Paulo trata do divórcio em contextos diversos e Ele reafirma a indissolubilidade do casamento cristão, porém reconhece situações de separação, especialmente entre cônjuges crentes e não crentes ao qual promove o princípio do "abandono" (verso 15), ou seja , se o descrente se separar, o crente não está sujeito à servidão e nem carrega a culpa do divórcio.
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3. DIVÓRCIO E NOVO CASAMENTO.
A teologia cristã no contexto da ética matrimonial apresenta diversas interpretações sobre o divórcio e o novo casamento.
Esse capítulo tem a finalidade de entender o panorama teológico das principais posições com base nas Escrituras Sagradas.
1) Divórcio e permanecer solteiro.
O divórcio, mesmo que permitido por adultério (Mt19.9) ou abandono (1Co7.15), não autoriza novo casamento (1Co7.10) e, dessa forma o indivíduo deve permanecer solteiro ou reconciliar-se com o cônjuge anterior (1Co7.11).
Isso leva a uma fidelidade perpétua ao primeiro casamento, com base na indissolubilidade espiritual do vínculo.
2) Divórcio e novo casamento com viúva.
O casamento com uma viúva é legítimo, pois a morte rompe o vínculo matrimonial para quem é viúva (1Co7.39 e Rm7.2-3), porém se o divórcio anterior para aquele que não é viúvo não foi legítimo (Mt19.9 e 1Co7.15), podemos chegar a conclusão que o novo casamento da parte daquele que não é viúvo é adultério e a nova união não é lícita com a viúva.
Em outras palavras, se o casamento anterior não foi anulado no contexto da lei, o cônjuge "divorciado" ainda está casado e não pode contrair novo matrimônio com a viúva.
3) Divórcio e novo casamento com divorciada.
Se o divórcio ocorreu por razões bíblicas, isto é, adultério (Mt19.9) ou abandono (1Co7.15) o novo casamento pode ser permitido com outro divorciado que também tenha razões bíblicas válidas.
Se o divórcio ocorreu por motivos não bíblicos de uma das partes (Mt5.32), então é considerado o novo casamento um ato de adultério contínuo (Mateus 19.9).
4) Divórcio e novo casamento com solteiro(a).
O divorciado está livre para casar, desde que seja por adultério (Mt19.9) ou abandono (1Co7.15) e, lógico pode se casar com outro indivíduo solteiro(a)
Se o divorciado se separou sem motivos legais (Mt19.9 e 1Co7.15), o novo casamento é visto como adultério ( Mt5.32).
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4. ARGUMENTOS TEOLÓGICOS A FAVOR DO DIVÓRCIO.
1) Permissão de Jesus em casos de imoralidade sexual
Mateus 19.9:
"Eu, porém, vos digo que qualquer que repudiar sua mulher, não sendo por causa de fornicação, e casar com outra, comete adultério."
Nesse texto, o próprio Jesus permite o divórcio em casos de infidelidade conjugal.
Importante destacar que a expressão "fornicação" se refere a relações sexuais ilícitas, ou seja, uma relação sexual proibida, imoral ou ilegal.
Dentro desse contexto, podemos enumerar alguns pontos:
* Relações fora do casamento (adultério).
* Incesto ( relação sexual entre parentes consanguíneos).
* Prostituição.
* Relação sexual com menor de idade.
* Relação com alguém incapaz de consentir.
Nesses casos, o divórcio é válido tal como registrado nessa passagem Bíblica através das palavras do próprio Jesus.
2) Liberdade do crente em caso de abandono pelo cônjuge incrédulo
1Coríntios 7.15:
"Mas, se o descrente quiser separar-se, que se separe; nestes casos, o irmão ou a irmã não está sujeito à servidão."
Apesar do contexto de 1 Coríntios 7.10-15 ser contra o divórcio, Paulo está afirmando que se o cônjuge não crente deixar o outro cônjuge (crente) em uma posição contra os princípios bíblicos, o crente não carrega a culpa do divórcio.
3) Reconhecimento da dureza do coração humano
Na passagem de Mateus 19.8, Jesus reconhece que Moisés permitiu o divórcio por causa da dureza do coração humano e, apesar do contexto de Mateus 19.3-9 ser contra o divórcio, a passagem de Mateus 19.9 deixa bem claro que o divórcio é válido em casos de relações sexuais ilícitas.
Portanto, em contextos de dureza e pecado persistente, o divórcio pode ser uma saída menos destrutiva para o casal.
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5. ARGUMENTOS TEOLÓGICOS CONTRA O DIVÓRCIO.
1) Projeto original de Deus para o casamento é a indissolubilidade
Gênesis 2.24:
"Portanto deixará o homem o seu pai e a sua mãe, e apegar-se-á à sua mulher, e serão ambos uma carne."
A expressão "serão ambos uma carne" enfatiza a ideia de que o divórcio não faz parte dos projetos de Deus.
Jesus reafirma isso em Mateus 19.6: "Portanto, o que Deus ajuntou, não o separe o homem."
2) Divórcio é apresentado como algo que Deus odeia
Malaquias 2.16:
"Eu odeio o divórcio, diz o Senhor, o Deus de Israel, ..."
Malaquias 2.16 é um versículo que tem gerado bastante debate, especialmente por causa das diferenças de tradução.
Em algumas versões lemos:
"Porque o Senhor, o Deus de Israel, diz que odeia o repúdio".
Porém, a expressão "Eu odeio o divórcio" ("Deus odeia o divórcio") é a interpretação mais tradicional e amplamente aceita nos círculos teológicos .
O contexto em Malaquias 2.14-16 condena os sacerdotes e também os homens de Judá por serem infiéis às suas esposas, mulheres da aliança e, Deus estaria afirmando que o divórcio é uma traição a essa aliança.
Portanto, o texto reforça a visão da aliança do casamento como algo sagrado.
3) Casamento como símbolo da união entre Cristo e a Igreja
Em Efésios 5.22–33, o casamento reflete o amor sacrificial e permanente de Cristo por Sua noiva, a Igreja, o que aponta para a fidelidade mesmo em meio a falhas.
Portanto, o amor sacrificial de Cristo para com sua noiva, a Igreja, é o exemplo do amor que o marido cristão deve apresentar para a sua esposa e, esse contexto em Efésios 5.22-33 demonstra que o divórcio é algo contrário ao ensinamento Bíblico.
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6. POSIÇÃO OFICIAL SOBRE O DIVÓRCIO NAS PRINCIPAIS DENOMINAÇÕES CRISTÃS.
1) Igreja Católica Apostólica Romana.
O divórcio não dissolve um matrimônio válido, pois a Igreja Católica Romana não reconhece o divórcio como moralmente legítimo, embora reconheça que, em alguns casos, a separação seja necessária.
Para o catolicismo, o casamento é indissolúvel, porém a igreja Católica Romana aceita à anulação matrimonial que declara que o casamento nunca foi válido desde o início.
O novo casamento após o divórcio é considerado adultério se o primeiro vínculo ainda é válido e não foi anulado (no sentido que o casamento nunca foi válido).
2) Igreja Presbiteriana.
Permite o divórcio em casos de adultério e abandono malicioso, e o novo casamento pode ser permitido após o divórcio, se houver base bíblica legítima, isto é, por ato de Adultério, abandono e segurança física do próprio cônjuge que pede o divórcio.
3) Igreja Batista.
Permite o divórcio em casos de adultério e abandono malicioso, e o novo casamento pode ser permitido após o divórcio desde que apresenta motivos bíblicos como adultério, abandono e segurança física do próprio cônjuge que pede o divórcio.
4) Igreja Luterana.
Reconhece a falibilidade humana e permite o divórcio em casos de infidelidade (adultério), violência ( contra o cônjuge que pede o divórcio) ou abandono malicioso.
O novo casamento é permitido após divórcio válido (divórcio por adultério, violência ou abandono).
5) Igreja Metodista.
Permite o divórcio quando o casamento se torna insustentável, especialmente em casos de abuso (sexual e violência), adultério e abandono malicioso.
O novo casamento é aceito, com encorajamento ao arrependimento dos erros relacionados ao casamento anterior, cura e restauração para o novo cônjuge.
6) Igreja Anglicana.
Reconhece a indissolubilidade do casamento, mas permite o divórcio e, em muitos casos, permite novo casamento com discernimento pastoral (aconselhamento pastoral).
7) Igreja Ortodoxa Oriental.
Reconhece o divórcio em certos casos (adultério, abuso sexual, violência e abandono malicioso), mas considera-o uma tragédia espiritual.
Na igreja Ortodoxa, a primeira união é vista como ideal (indissolubilidade), enquanto que o novo casamento é visto como fraqueza humana. ( física e espiritual).
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BIBLIOGRAFIA.
1. Wayne Grudem. Teologia Sistemática.
2. Cânones da Igreja Metodista (2023).
3. Jay E. Adams. Casamento, divórcio e novo casamento na Bíblia.
4. Norman L. Geisler. Ética Cristã: opções e questões contemporâneas.
5. J. D. Douglas (editor). O Novo Dicionário da Bíblia.
6. D. A. Carson (editor). Comentário Bíblico Vida Nova.
7. A Confissão de Augsburgo.
8. F. F. Bruce (editor). Comentário Bíblico NVI Antigo e Novo Testamentos.
9. Leon Morris. 1Coríntios: Introdução e Comentário.
10. R. V. G. Tasker. Mateus: Introdução e Comentário.
11. Catecismo da Igreja Católica.
12. Atas do supremo concílio da IPB.
13. Declaração doutrinária da Convenção Batista Brasil.
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Luciano Nobre Frasson.
Formação em Teologia curso livre.
Especialização em Pregação.
Mestrado em Divindade.
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